segunda-feira, 6 de junho de 2011

O new journalism e o boom da literatura hispano-americana


Sei que estou em falta com o blog, mas razões existem para isso. Encontro-me em processo de mudança de Campina Grande para João Pessoa, além da reviravolta do meu projeto de mestrado, todavia segue abaixo uma parte do artigo "'Crônica de uma morte anunciada' de Gabriel García Márquez: Interfaces entre literatura e jornalismo" que irei apresentar no VII SELIMEL (Seminário Nacional sobre Ensino de Língua Materna e Estrangeira e de Literatura) na UFCG.

A segunda metade do século XIX, marcada na literatura pelo Realismo em sua tentativa de expor fielmente os fatos históricos, contrapondo-se ao subjetivismo da escola literária anterior (Romantismo) e com foco em uma postura cientifica, surge com o objetivo nítido de reproduzir fielmente o cotidiano social. Nesse contexto os romancistas da época realizavam na visão de Tom Wolfe, jornalista e PhD em literatura, um verdadeiro trabalho de repórter do seu tempo. “Os romancistas aceitavam rotineiramente a desconfortável tarefa de fazer reportagem, ‘cavando’ a realidade simplesmente para reproduzi-la direito. Isso era parte do processo de escrever romances” (WOLFE, 1973 apud LIMA, 1995, p. 140). A semelhança do que faria a reportagem mais tarde não é mera coincidência, uma vez que é deste processo que o jornalismo extrairia a melhor contribuição para a sua prática de escritura do real.

Assim é sob forte influência desse contexto que uma nova proposta narrativa, o new journalism (novo jornalismo) surge nos Estados Unidos, na década de 60. Consistindo em um texto hibrido de jornalismo e literatura. “Uma narrativa que, mesmo sendo jornalística poderia ser lida como uma novela” (BIANCHIN, 1997, p. 35). Alcançando a sua maturidade com a publicação do livro A Sangue Frio, de Truman Capote, lançado em 1966.

Em sua construção o novo jornalismo tomava de empréstimo aos romancistas do Realismo quatro técnicas: “1) narração cena por cena; 2) reprodução de diálogos; 3) ponto de vista de terceira pessoa e 4) relato das ações do dia-a-dia” (BIANCHIN, 1997, p. 35).

Enquanto isso ocorre nos Estados Unidos, em outras localidades também se processam mudanças nas formas de narrar. É o que ocorre no boom da narrativa hispano-americana que se move para o estudo da identidade nativa, em uma ideologia da América Latina preocupada em repensar a história oficial e suas vias de determinações impostas através do olhar dos centros dominantes. Almejando o rompimento com o texto tradicional, buscando a construção de uma imagem do real polivalente que exprimisse as particularidades do Novo Mundo (CHIAMPI, 2008).

Inserido neste pensamento de produção, encontramos intelectuais que começaram a sua carreira profissional como jornalistas, entre eles Gabriel García Márquez, Mario Vargas Llosa, Julio Cortazar, Carlos Fuentes, José Donosco, Alejo Carpentier. E todos compartilhavam a visão de que não podiam abraçar as tendências literárias do Realismo europeu de forma homogenia, afinal elas não se ajustavam ao contexto particular de suas localidades. Dessa forma, os escritores latino-americanos romperam com o realismo tradicional e criaram o Realismo Mágico, termo entrelaçado com a noção da aparente fusão entre realidade e fantasia, em distinção marcante às narrativas européias (CHIAMPI, 2008). Eles acreditavam que a realidade latino-americana não se enquadrava no modelo europeu baseado no capitalismo racional, no desenvolvimento progressivo e linear.

Segundo Lima (1995, p.151),
(...) o boom da literatura hispano-americana dos anos 60, apresenta pelo menos um ponto em comum com o novo jornalismo: a vivacidade da linguagem, sua referência a um palpitante mundo imaginário no primeiro, a uma realidade sensualmente palpável, no segundo. Quer dizer, ambos recuperaram a capacidade do texto emocionar, ambos trabalham com arte tanto o aspecto racionalista – dito objetivo – quanto o subjetivo da realidade, apontando para a sua dualidade. O sensualismo concede aos textos, num e noutro caso, capacidade de evocação e portanto facilidade de reprodução imaginária da realidade – seja fictícia seja factual. (...). O new journalism é quente, a literatura hispano-americana do período, idem. Ambos procuram provocar o leitor para um reordenamento tanto intelectual quanto emocional.

Percorrendo as duas vertentes em um caminho singular, Gabriel García Márquez consegue seduzir o leitor, trabalhando tanto na capacidade de aflorar emoções quanto na apresentação da dualidade dos fatos extraordinários que acorrem na America Latina.

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